«Nas férias não se deve estudar. Eu sou de opinião que nas férias não se deve estudar. Nas férias cada um deve dar largas às suas tendências, governadas, bem entendido, pelo bem, e pelos conselhos dos mais prudentes. Quem tem tendência para viajar, deve viajar; e a primeira viagem, e a mais útil, que cada um tem a fazer é à roda da sua própria terra, procurando conhecer muito bem a sua freguesia, depois da sua freguesia o seu concelho, depois do seu concelho o seu distrito, depois do seu distrito a sua província; e depois, com o tempo, as outras províncias do seu país.»
Este é o início do texto As férias, um dos setenta e cinco que compõem a obra O meu livrinho, que Trindade Coelho escreveu em 1898 – autor de quem eu apenas conhecia os contos rústicos de Os meus amores – e que logo me lembrou o início das Viagens na Minha Terra, de Almeida Garrett, editadas em volume em 1846: «Que viaje à roda do seu quarto quem está à beira dos Alpes, de Inverno, em Turim, que é quase tão frio como Sampetersburgo – entende-se. Mas com este clima, com este ar que Deus nos deu, onde a laranjeira cresce na horta, e o mato é de murta, o próprio Xavier de Maistre, que aqui escrevesse, ao menos ia até ao quintal».
Assim, na linha de um nacionalismo literário que continua o legado de Almeida Garrett, também Trindade Coelho incita o seu leitor a sair do quarto e a viajar pela sua terra, (re)encontrando nela o conhecimento que alimenta o amor às origens. A verdade é que, se os tempos mudam, continuamos a aproveitar as férias para viajar até à aldeia dos nossos pais ou dos nossos avós, sentindo nesse regresso a sua presença – ainda que já não estejam – e a certeza de uma força ancestral que sentimos correr nas veias como reminiscências da nossa identidade. Há lugares e pessoas que nos estão no sangue, todos nós – como Aquilino – temos a nossa Geografia Sentimental.