Continuamos a viver numa sociedade que santifica as mães, mas pune a maternidade. A pressão para ser uma mãe perfeita pode ser esmagadora. É urgente que olhemos com mais amor e que humanizemos as mães. Deixemos de as sobrecarregar com a ilusão de que são super-heroínas ou de que conseguem sempre dar conta de tudo.
Por vezes, não conseguem, e está tudo bem! Super-heroínas só existem na ficção. Em 1949, o psicanalista inglês Donald Winnicott apresentou o conceito de “mãe suficientemente boa”, contrastando com a pressão que muitas mulheres carregam de que têm de ser mães perfeitas.
A “mãe suficientemente boa” é aquela que está atenta e responde no momento oportuno às necessidades de amparo e cuidado do bebé, mas não de forma excessiva.
Ela também falha, e é justamente o somatório das falhas, seguido do tipo de cuidados que repara essas falhas, que acaba por comunicar amor à criança, ajudando-a a constituir-se psiquicamente. A “mãe suficientemente boa” vê a maternidade como um encontro entre duas pessoas distintas, que se vão conhecendo e partilhando emoções, momentos bons e difíceis, vivendo de forma genuína e prazerosa este vínculo único e forte. Ela apresenta ao bebé o mundo como um lugar acolhedor e seguro, sendo também capaz de se tornar progressivamente “desnecessária” à medida que o bebé cresce e se
desenvolve, tornando-se um “ser” independente.
Não existem receitas rígidas, nem guiões infalíveis para a capacidade de ser uma boa mãe, mas o que Donald Winnicott traz ao de cima é que a mãe pode falhar de maneira saudável, não respondendo imediatamente a todas as necessidades do bebé, permitindo-lhe que experiencie pequenos desafios. Essas pequenas frustrações são essenciais para o desenvolvimento emocional – ajudam o bebé a tolerar o desconforto, desenvolver resiliência e perceber que o mundo não gira apenas à sua volta.
As mães não precisam de ser perfeitas, mas sim “suficientemente boas”. A pressão para ser a mãe perfeita, ideal, que sabe sempre o que o bebé precisa é irrealista e pode gerar ansiedade desnecessária. A imperfeição faz parte da condição humana. Em última análise, a perfeição é um ideal que muitos perseguem, mas que permanece elusivo. Afinal, é na imperfeição que muitas vezes encontramos a verdadeira beleza da nossa humanidade. E apesar de a perfeição ser algo inalcançável, a procura pela mesma faz parte da nossa natureza como seres humanos.
Não precisamos de ter ou tentar construir famílias perfeitas, pais e filhos excelentes ou com a relação perfeita. Esse é um conceito idealizado que só traz frustração e desencontros. Como Pedro Strecht diz no seu livro “pais suficientemente bons”, a imagem do presépio, evocada em muitas religiões como um modelo de harmonia e perfeição, é, na verdade, apenas isso, um modelo. Um modelo que é para ser apreciado, como uma obra de arte, estática, em contraste com as dinâmicas em constante movimento que caracterizam o ser humano que não são para ser apreciadas, mas sim sentidas. O que realmente desejamos, enquanto comuns mortais, na vida real, são exemplos vivos e acessíveis. Imperfeitos.
Desejamos a existência de famílias equilibradas, que, no seu quotidiano procurem constantemente o melhor ponto de harmonia. Famílias onde o caos é uma parte natural das experiências que as estruturam,
dão significado e as tornam espaços de segurança, comunicação saudável, conexão e afeto. Amor-próprio e amor pelo outro, tal como ele é e no que ele é.
É preciso ter mães suficientemente boas para que haja filhos que saibam que não têm de ser perfeitos.