ARTIGO DE OPINIÃO: Habitação

23/05/2023 18:30

Portugal atravessa, há vários anos, uma crise ao nível da habitação, problema muito sério cuja solução deveria ter sido encontrada antes de se chegar a este caos. Deviam ter sido definidas formas e delineadas estratégias para que as famílias tivessem sempre direito a uma habitação digna, até porque que este é um Direito consagrado na Constituição. Chegou-se a um extremo que culminou com a falta de habitação para arrendamento e a impossibilidade de acesso da maioria das pessoas ao crédito bancário para aquisição de casa e até para a reabilitação. Paralelamente o aumento constante das prestações em virtude do aumento dos juros o faz com que as famílias quase sufoquem com as prestações.

Recentemente o Governo lá resolveu apresentar um conjunto de medidas, que na minha humilde opinião, pouco adiantam, como é o caso do programa “Mais habitação” ou da bonificação temporária dos juros. Não deveria este problema ser pensado doutra forma? Porque não o Estado aumentar a oferta de casas, que poderia passar pela reabilitação do seu próprio Património? Por outro lado, deveria proporcionar condições aos jovens e às famílias para que a habitação não seja “O” problema das suas vidas, melhorando as condições de trabalho, diminuindo a carga fiscal e combatendo a especulação… Não será justo o sentido de revolta que se instala quando o simples Cidadão a quem é negado o acesso a uma habitação digna ver os seus impostos serem usados em indeminizações milionárias ou para salvar bancos? 

Neste âmbito, hoje escolho falar um pouco sobre Álvaro Siza Vieira. Talvez porque nutra por ele uma grande admiração, porque o considero uma pessoa que soube ao longo dos anos manter uma profunda lucidez e modéstia, em relação ao seu próprio percurso profissional, porque consigo sentir e ver na sua obra a paixão pelo que faz. Falar de Siza Vieira é falar de arquitetura e, também, falar de habitação. Detentor de vários prémios e reconhecimentos a nível nacional e internacional, entre os quais o Prémio Mies Van der Rohe de 1988 e o Pritzker em 1992 (considerado o Nobel da Arquitetura). Siza Vieira foi distinguido e reconhecido múltiplas vezes ao longo da sua carreira. No entanto, a minha atenção recai hoje sobre os projetos que desenvolveu logo após abril de 1974.  A 31 de Julho desse ano, formou-se uma organização chamada de Serviço de Apoio Ambulatório Local (SAAL) que tinha como objetivo aliviar as precárias condições habitacionais do país. Siza Vieira colaborou nesta organização com a realização de dois grandes projetos: o Bairro da Bouça, no Porto, e as casas geminadas S.Vitor, estas últimas infelizmente em ruínas. Nestes conjuntos arquitetónicos compostos por edifícios multifamiliares em banda de quatro pisos que formam quarteirões abertos, Siza Vieira teve a preocupação de conciliar estes edifícios de simplicidade geométrica com o espaço envolvente, com o espaço da cidade. Mas isto é apenas um pormenor, que de alguma forma até podia ser inspirador… 

Hoje, ao olharmos para as nossas cidades apercebermo-nos das infinitas possibilidades de resolver os problemas habitacionais do nosso país, quer pela reabilitação do edificado, quer através de um efetivo e ponderado planeamento das novas construções. Ainda para mais Portugal tem excelentes arquitetos. Pensar seriamente nestas soluções trará benefícios económicos e sociais, fará com que as pessoas possam pensar num futuro mais estável e feliz.

Atualmente oito das obras de Álvaro Siza Vieira são candidatas a Património Mundial da Unesco: Museu de Serralves (1997); Bairro da Bouça; Edifício da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (1986-93); Casa de Chá da Boa Nova (1963); Piscina das Marés (1966); Igreja do Marco de Canaveses (1990-96); Casa Alves Costa, em Caminha e o Pavilhão de Portugal em Lisboa.

Tenho a certeza de que, nalgum momento da nossa vida, nos cruzámos com alguma das suas obras, se não, vale sempre a pena irmos ao seu encontro. 

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