Como treinador e especialista em preparação física, acredito que uma das grandes lacunas na área de saúde desportiva ainda é a adaptação individualizada dos programas de prevenção e recuperação de lesões. Hoje, com os avanços na ciência desportiva e na tecnologia de monitorização, temos a capacidade de conhecer profundamente o perfil físico e as necessidades de cada atleta, algo que considero essencial para uma abordagem mais eficaz.
A nível de prevenção, protocolos como o FIFA 11+ mostram-se eficazes na redução de lesões, especialmente nos músculos isquiotibiais e no quadríceps, alcançando uma diminuição significativa dos índices de lesão. No entanto, não podemos basear toda a prevenção num único programa, já que as características de cada atleta e as exigências do seu desporto variam. Da minha experiência, uma avaliação que considere fatores como a biomecânica, as características antropométricas e até as alterações hormonais permite uma compreensão mais aprofundada sobre os riscos específicos de cada atleta.
Em casos como as lesões do ligamento cruzado anterior (LCA), onde até 70% das lesões ocorrem sem contacto, torna-se crucial analisar como o treino pode impactar a coordenação neuromuscular. Investir no desenvolvimento da força e no controlo postural do atleta, focando em mecanismos como desaceleração e estabilidade articular, é uma estratégia que tenho visto dar resultados substanciais. Acredito que a prevenção não deve apenas focar-se em evitar lesões, mas também em melhorar a capacidade de resposta e adaptação do corpo ao esforço físico.
No que diz respeito à reabilitação, defendo que o retorno ao jogo deve ser tratado como um processo dinâmico e não como uma meta com um prazo fixo. Trabalhar as qualidades físicas e cognitivas em conjunto, tal como o modelo de reabilitação do FC Barcelona propõe, tem se mostrado eficaz para preparar o atleta para as exigências reais da competição. Na fase de recuperação de uma lesão no joelho, por exemplo, há que considerar não só o restabelecimento da força, mas também a recuperação do movimento articular, da propriocepção e do tónus muscular para um regresso seguro e bem-sucedido.
A realidade do desporto profissional coloca frequentemente pressão sobre o atleta e a equipa médica para acelerar o regresso à competição. Contudo, insisto que o bem-estar a longo prazo do atleta deve ser uma prioridade absoluta. Ao longo da minha carreira, tenho observado que decisões precipitadas frequentemente resultam em recaídas ou lesões adicionais, prejudicando tanto o atleta quanto a equipa.
Como parte de uma abordagem ética, considero que o atleta deve ter um papel ativo no processo de decisão, de modo a garantir que o seu regresso ao jogo respeita as suas capacidades atuais e os riscos envolvidos. Em última análise, a individualização do treino e da recuperação, aliada ao uso de tecnologia e dados detalhados sobre o perfil físico de cada atleta, oferece a melhor resposta para reduzir o risco de lesões e maximizar a performance desportiva.
Conclusão
Como profissional dedicado ao desporto e à saúde dos atletas, acredito que o futuro do treino e da reabilitação desportiva passa por uma abordagem cada vez mais integrada e centrada no indivíduo. A colaboração entre treinadores, fisioterapeutas, médicos e outros especialistas permite uma visão completa do atleta, garantindo que o seu bem-estar é sempre o foco principal. A utilização de dados e tecnologia para monitorizar cargas de treino, indicadores de recuperação e até fatores de risco específicos são hoje aliados indispensáveis para a tomada de decisão informada.
No final, considero o nosso objetivo deve ser criar um ambiente onde a performance e a saúde coexistam de forma sustentável, permitindo ao atleta alcançar o seu potencial máximo, reduzindo ao mínimo os riscos para a sua carreira e qualidade de vida.