ARTIGO DE OPINIÃO: Aprender (ou não) com a(s) História(s)

17/09/2025 19:30

Por um lado, podemos entender a História como sucessão progressiva de acontecimentos irrepetíveis; por outro, podemos entender que lhe subjaz uma dimensão cíclica, uma vez que eventos, estádios ou fases parecem repetir-se em ciclos mais ou menos longos. Nesta perspetiva, a ocorrência de ciclos – ainda que com as naturais diferenças contextuais e sem que impeçam a existência de progresso ou evolução – deveria proporcionar, aos indivíduos em particular e às sociedades em geral – uma oportunidade de, num exercício de antecipação, impedir a repetição de erros, de crisesou de retrocessos civilizacionais. 

Entre as várias razões que poderão explicar a diminuição do número de alunos no acesso ao Ensino Superior em Portugal – e que não podemos considerar isoladamente – contamos certamente a impossibilidade que muitas famílias têm de suportar as despesas inerentes à frequência de um curso superior. Propinas, despesas de alojamento e de deslocação afastam os jovens do Ensino Superior, afastando-os também da qualificação, da competitividade, da participação cívica e do crescimento pessoal. 

Não há e não houve – não tem havido – por parte do poder político central capacidade de antecipação no que respeita à Educação, a menos que – é uma hipótese que nos ocorre – exista a intenção de limitar ou afunilar o acesso dos jovens à prossecução de estudos, reservando-a para uma elite ou um segmento privilegiado da sociedade. 

Não podemos voltar ao tempo em que o professor – isto se, daqui por uns tempos, também tivermos professores – pedia, em vão, aos pais dos seus alunos que os deixassem continuar a estudar. Não podemos voltar ao tempo em que estudar era o privilégio de poucos e o sonho de muitos. 

Relembremos o seguinte excerto de Esteiros, obra publicada por Soeiro Pereira Gomes, em 1941: 

«A creche não se fez. E Madalena ficou sozinha com um filho nos braços − o garoto que, anos depois, em certa manhã de outono, veio mostrar-lhe as botas rotas.

– Mãe: olhe pra isto. Prá semana abre a escola…

Ela hesitou por momentos, sem saber como mostrar ao filho o lar vazio, o lume apagado… E João insistiu: 

− Não posso ir descalço prá escola, pois não? 

− Escuta, meu filho: eu estou doente, já não posso trabalhar. Cingiu o garoto nos braços e, mirando-lhe o corpo franzino, murmurou sem convicção: − Estás um homem, João. Já podes ajudar a tua mãe. 

Veio-lhe ao pensamento a última carta do seu Pedro. «…Manda o nosso filho para a escola. Sem instrução, será um escravo ou um vadio…».

− Então não vou mais prá escola? − perguntou João. 

− Vais, quando eu tiver saúde. 

O pequeno compreendeu a incerteza da resposta e descaiu a cabeça sobre o peito. Ia a perguntar: − Já não serei doutor? – Mas a comoção embargou-lhe a voz.»

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