
A festa anual da Banda Desenhada na Amadora é um ponto de encontro de muitos amantes das histórias aos quadradinhos. Anualmente, sozinho ou muito mais vezes acompanhado, regresso à Amadora para fazer reportagem para a revista Anim’arte e fanzine VIRIATVS, para ver as novidades e apresentações, ou para “caçar” algum autógrafo de famosos (autores/desenhadores/argumentistas).
Este outubro, entre outros álbuns interessantes, descobri a obra narrativa (novela gráfica, como agora se diz) intitulada COMO PEDRA, do brasileiro LuckasIohanathan”, aclamada novela gráfica (banda desenhada), que venceu o Prémio Jabuti 2024 na categoria de Histórias em Quadrinhos.
“Como Pedra” é uma obra que se desenrola no árido Sertão nordestino do Brasil,abordando temas profundos como a resiliência, a fé e a luta pela sobrevivência face à seca e à fome. É uma edição da POLVO. A expressão “Como pedra” é uma metáfora para a resistência e a dureza da vida das personagens
Luckas Iohanathan é responsável pelo argumento, arte e cores da obra. A história foca-se numa família que enfrenta as adversidades extremas do clima e da vida no sertão. Como Pedra é daqueles livros que nos chegam de mansinho, quase sem que ninguém repare neles, mas aqueles que lhe dão uma oportunidade encontram nesta banda desenhada solitária, companhia para o espírito e matéria para reflexão. A obra promete-nos uma travessia pelo Sertão profundo, mas aquilo que o autor nos oferece é, acima de tudo, uma descida lenta, mas profunda, às camadas mais áridas da condição humana, onde a seca não é apenas climática, mas também espiritual, social, emocional; e onde a fome não é apenas por alimento para o corpo, mas também por alimento para a alma.
A forma como Iohanathan explora o fanatismo é subtil, mas incisiva. O autor não caricatura nem demoniza abertamente a religião, limitando-se a mostrar o modo gradual como a crença se infiltra e como a esperança distorcida pode ser mais devastadora do que a própria miséria (in Vinheta 2020 -Hugo Pinto).
Artisticamente a obra impressionou-me bastante, com um estilo de desenho queremete, de certa forma, e com as devidas distâncias, para o traço de Bastien Vivès, mostrando-se minimalista, mas elegante, de linhas limpas e expressivas, e dando espaço a que as sombras possam desempenhar um papel essencial. As cores, em tons amarelados, incrementam a sensação de aridez, de calor, de seca, de desolação. É verdade que, por vezes, os desenhos podem ser um pouco despidos demais, mas creio que isso é opção autoral com um propósito claro de se atingir uma certa poesia. Uma obra num registo próximo da linguagem cinematográfica, de rápida leitura, mas a exigir longa degustação.
Para além do Prémio Jabuti, a obra está indicada para outros prémios internacionais, como o de Melhor Álbum no Festival de Angoulême. Existe a previsão de que seja adaptada para o cinema.
Boas Leituras.















