ARTIGO DE OPINIÃO – (i)Literacia em Saúde: Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono 

20/11/2023 18:23

A Apneia Obstrutiva do Sono é uma doença do sono em que ocorrem apneias (momentos de paragem da respiração) repetitivas, quer totais, quer parciais1. Esta recorrência das apneias prejudica a qualidade do sono e a correta oxigenação do sangue.

Esta doença é caracterizada pelo colapso das vias aéreas durante o sono e, a longo prazo e sem tratamento, pode  provocar cansaço persistente, alterações do humor esonolência excessiva durante o dia, que pode,  por sua vez, provocar disrupções no quotidiano, incluíndo acidentes de trabalho e de viação, esquecimentos, ou  outros incómodos, devido à falta de descanso.

O que é a SAOS e porque é importante?

A Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS) é uma das doenças respiratórias crónicas mais prevalentes3, e é um problema de saúde global2. A probabilidade de sofrer de SAOS vai aumentando com a idade, e a doença pode também estar associada ao excesso de peso, retrognatismo (uma mandíbula recuada em relação ao maxilar), ou outras alterações da anatomia maxilofacial que condicionem a diminuição do espaço da via aérea3.

Fatores de Risco e Sintomas – quais são e como os posso detetar?

Muitas vezes, as pessoas que mais rapidamente detetam os sintomas da SAOS são os/as cônjugues das pessoas afetadas. Um dos sintomas predominantes da doença é o ressonar excessivo, incessante ou incomodativo, que chega a despertar os parceiros do seu sono, ainda que possa não despertar completamente a pessoa afetada. Como a via aérea está obstruída, a passagem forçada do ar, contra a resistência, provoca a vibração do palato, da úvula e das paredes laterais da faringe3, resultando num ressonar difícil de ignorar. Além do ressonar, podem também ser testemunhadas as apneias (paragem completa momentânea da respiração)2.

Existem também sintomas que a própria pessoa pode detetar, como acordar durante a noite com uma sensação de asfixia, ter dificuldade em manter-se a dormir durante a noite, dor de cabeça matinal, ou fadiga e sonolência durante o dia2.

Um maior risco de sofrer de SAOS associa-se a certos achados físicos, tais como: desvios do septo nasal ou pólipos nasais, macroglossia (isto é, língua anormalmente grande), um aumento de tamanho das amígdalas, um palato estreito, ou quaisquer características que diminuam o espaço da cavidade oral posterior, como a retrognatia1; bem como a obesidade, especialmente se associada a um pescoço mais largo2 .

Na presença destes fatores de risco e sintomas deve dirigir-se ao seu médico de família e conversar sobre.

Diagnóstico – como é que os meus médicos vão saber se tenho mesmo SAOS?

O melhor teste para diagnosticar SAOS é uma prova de sono em laboratório, chamada Polissonografia2. A Polissonografia é um exame que se realiza com sensores que registam, por exemplo, atividade elétrica cerebral, movimentos dos olhos, atividade muscular e cardíaca, fluxos de respiração incluindo o ressonar e posições corporais4. Através deste exame, os profissionais de saúde medem a existência e a quantidade de apneias durante o sono, e conseguem detetar os microdespertares , dos quais por vezes a própria pessoa não se apercebe, mas que perturbam efetivamente a qualidade do sono. A par da qualidade do sono, é possível perceber a oxigenação do sangue e se esta está prejudicada. 

Quais as consequências da SAOS?

É importante compreender que o conjunto de efeitos provocados pela SAOS pode ter impactos que vão para lá da qualidade do sono. A dificuldade de oxigenação, os vários microdespertares noturnos, e o stress induzido pela luta do corpo por assegurar a respiração, influenciam os outros sistemas do corpo. A ativação recorrente do corpo durante o sono pela falta de oxigénio aumenta a tensão arterial, promove um estado pró-inflamatório das células do sanguee pode alterar padrões de ritmo cardíaco3. Alguns destes efeitos permanecem mesmo quando a pessoa já não está a dormir, ou seja, perpetuam-se nas 24h e em todas as alturas do dia.. A evidência científica encontra associação entre a SAOS e doenças cardiovasculares (como o AVC, a hipertensão e a diabetes)1. As pessoas com SAOS não tratado podem ter 7 vezes maior probabilidade de estarem envolvidas em acidentes de viação2.

Qual o tratamento para a SAOS?

Existem modalidades de intervenção mais e menos invasivas. Para pessoas com obesidade ou excesso de peso aconselha-se sempre a perda de peso1, através da melhoria dos hábitos alimentares e de exercício físico. 

Em geral, o aparelho de Pressão Positiva Contínua nas Vias Aéreas (vulgo CPAP na sigla inglesa)1,2,3 é o instrumento mais utilizado para tratar a SAOS, e a modalidade mais importante atualmente. Este aparelho funciona mantendo sempre uma certa pressão nas vias aéreas, impedindo que elas colapsem e que se interrompa o fluxo de ar oxigenado para os pulmões. Este aparelho, nas suas versões mais atuais, é mais pequeno que uma caixa de sapatos, cabendo confortavelmente numa mesa de cabeceira, e pode ter integrado um mecanismo que também humedece o ar, prevenindo o desconforto no seu uso. Liga-se a uma máscara simples que, na hora de dormir, a pessoa geralmente colocará por cima do nariz e a boca, e com a qual permanecerá enquanto dorme. Apesar de parecer desconfortável, novas inovações tecnológicas permitem a evolução dos aparelhos para o seu uso confortável, pois é do interesse da comunidade médica e de cuidados de saúde que as pessoas possam praticar o tratamento sem dificuldades, principalmente dados os efeitos já falados.

É possível que o CPAP e certas medidas conservadoras como a perda de peso e a posição de dormir, continuem a ser os tratamentos preferidos, por não terem o mesmo impacto do uso permanente de um dispositivo dentro da boca enquanto se dorme (o que pode secar a mucosa oral e provocar desconforto), ou de uma correção cirúrgica (apesar de, em pacientes selecionados, como os que sofrem de retrognatismo sem outros fatores que favoreçam SAOS, poder ser preferida uma correção de uma obstrução evidente1). Finalmente, é importante mencionar que o uso de sedativos ou consumo de álcool podem piorar a SAOS e, portanto, a diminuição ou evicção do consumo destas substâncias também é um dos alvos da intervenção conservadora2.

Em suma, o o diagnóstico e tratamento atempado da SAOS contribui para a  Qualidade de Vida da pessoa. O tratamento da SAOS pode diminuir não só a incidência de problemas de saúde físicos, mas também de alterações de humor provocadas pela falta de descanso, que prejudicam a vida e as relações plenas das pessoas afetadas. Esta é uma doença tratável, e todas as consequências negativas que pode trazer podem ser evitadas, conduzindo a uma vida mais satisfatória e a uma melhoria da saúde física.

Mais ainda, ter um estilo de vida saudável com uma alimentação equilibrada, pratica desportiva regular e hábitos de sono adequados ajudam a prevenir o aparecimento de SAOS.

Bibliografia

  1. Obstructive Sleep Apnea in Adults | DynaMed
  2. Adult obstructive sleep apnoea | Lancet  
  3. Obstructive sleep apnoea syndrome | Nature Reviews Disease Primers  
  4. Polissonografia | Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental 

[English version] 

(i)Health Literacy: Obstructive Sleep Apnoea Syndrome

Obstructive Sleep Apnoea is a sleep disorder in which there are repetitive apnoeas (moments when breathing stops), either total or partial1. This recurrence of apnoea impairs the quality of sleep and the correct oxygenation of the blood.

This condition is characterised by the collapse of the airways during sleep and, in the long term and without treatment, can lead to persistent tiredness, mood swings and excessive sleepiness during the day, which in turn can cause disruptions in everyday life, including accidents at work and on the road, forgetfulness or other inconveniences due to the lack of rest.

What is OSAS and why is it important?

Obstructive Sleep Apnoea Syndrome (OSAS) is one of the most prevalent chronic respiratory diseases3 and is a global health problem2. The likelihood of suffering from OSAS increases with age, and the disease can also be associated with excess weight, retrognathism (a jaw set back in relation to the maxilla), or other alterations in the maxillofacial anatomy that lead to a reduction in airway space3.

Risk Factors and Symptoms – what are they and how can I detect them?

Often, the people who are quickest to detect the symptoms of OSAS are the spouses of those affected. One of the predominant symptoms of the disease is excessive, incessant or annoying snoring, which even wakes partners from their sleep, although it may not wake the affected person completely. As the airway is obstructed, the forced passage of air against resistance causes the palate, uvula and lateral pharyngeal walls to vibrate3, resulting in snoring that is difficult to ignore. In addition to snoring, apnoea (momentary complete cessation of breathing) can also be witnessed2.

There are also symptoms that the person themselves can detect, such as waking up during the night with a feeling of suffocation, having difficulty staying asleep during the night, morning headaches, or fatigue and sleepiness during the day2.

A higher risk of suffering from OSAS is associated with certain physical findings, such as: deviations of the nasal septum or nasal polyps, macroglossia (i.e. an abnormally large tongue), an increase in the size of the tonsils, a narrow palate, or any features that decrease the space of the posterior oral cavity, such as retrognathia1; as well as obesity, especially if associated with a wider neck2.

In the presence of these risk factors and symptoms, you should go to your family doctor and discuss them.

Diagnosis – how will my doctors know if I really have OSAS?

The best test to diagnose OSAS is a laboratory sleep test called polysomnography2. Polysomnography is a test that is carried out using sensors that record, for example, brain electrical activity, eye movements, muscle and heart activity, breathing flows including snoring and body positions4. Through this test, health professionals measure the existence and quantity of apnoeas during sleep, and can detect micro-awakenings, which the person sometimes doesn’t realise, but which effectively disrupt the quality of sleep. In addition to the quality of sleep, it is also possible to see whether blood oxygenation is impaired.

What are the consequences of OSAS?

It’s important to realise that the set of effects caused by OSAS can have impacts that go beyond the quality of sleep. The difficulty in oxygenation, the many nocturnal micro-awakenings, and the stress induced by the body’s struggle to ensure breathing, influence the body’s other systems. The recurrent activation of the body during sleep due to lack of oxygen increases blood pressure, promotes a pro-inflammatory state in blood cells and can alter heart rhythm patterns3. Some of these effects remain even when the person is no longer asleep, in other words, they are perpetuated 24 hours a day and at all times of the day. Scientific evidence finds an association between OSAS and cardiovascular diseases (such as stroke, hypertension and diabetes)1. People with untreated OSAS may be 7 times more likely to be involved in road accidents2.

What is the treatment for OSAS?

There are more and less invasive forms of intervention. For people who are obese or overweight, weight loss1 is always recommended, along with improved eating habits and physical exercise. 

In general, the Continuous Positive Airway Pressure (CPAP) device1,2,3 is the most widely used tool to treat OSAS, and the most important modality today. This device works by maintaining a certain pressure in the airways at all times, preventing them from collapsing and interrupting the flow of oxygenated air to the lungs. This device, in its most modern versions, is smaller than a shoebox, fitting comfortably on a bedside table, and can have an integrated mechanism that also humidifies the air, preventing discomfort when using it. It attaches to a simple mask which, at bedtime, the person will usually put over their nose and mouth and wear while they sleep. Despite seeming uncomfortable, new technological innovations have allowed the devices to evolve so that they can be used comfortably, as it is in the interest of the medical and healthcare community that people can practise the treatment without difficulty, especially given the effects already mentioned.

It is possible that CPAP and certain conservative measures such as weight loss and sleeping position will continue to be the preferred treatments, as they don’t have the same impact as permanently using a device inside the mouth while sleeping (which can dry out the oral mucosa and cause discomfort), or surgical correction (although in selected patients, such as those with retrognathism without other factors favouring OSAS, correction of an obvious obstruction may be preferred)1. Finally, it’s important to mention that the use of sedatives or alcohol consumption can worsen OSAS and, therefore, reducing or avoiding the consumption of these substances is also one of the targets of conservative intervention2.

To sum up, the timely diagnosis and treatment of OSAS contributes to the person’s Quality of Life. Treating OSAS can reduce not only the incidence of physical health problems, but also mood swings caused by lack of rest, which jeopardise the lives and relationships of those affected. This is a treatable disease, and all the negative consequences it can bring can be avoided, leading to a more satisfying life and improved physical health.

Moreover, a healthy lifestyle with a balanced diet, regular sports practice and adequate sleep habits help prevent the onset of OSAS.

Bibliography

  1. Obstructive Sleep Apnea in Adults | DynaMed
  2. Adult obstructive sleep apnoea | Lancet  
  3. Obstructive sleep apnoea syndrome | Nature Reviews Disease Primers  
  4. Polissonografia | Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental 
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