Os jovens portugueses são possivelmente a geração mais qualificada de sempre, mas debatem-se constantemente com problemas como baixos salários e sem progressão na carreira, instabilidade contratual, inflação, alterações climáticas que avizinham um mundo muito perigoso e dificuldades de autonomia devido ao aumento dos preços da habitação, o que dificulta cada vez mais a saída de casa dos pais e a transição para a parentalidade.
Muitas crianças, adolescentes e jovens adultos têm uma visão globalmente negativa desse tempo futuro. São frequentemente expostos a frases como “A juventude está perdida”, “Vai ser muito difícil entrar na universidade”, “Vai ser muito difícil arranjar um emprego”, “Vai ser muito difícil teres a tua própria casa”, “A vida será muito mais difícil do que agora por isso aproveita…” e outras semelhantes em que tudo vai ser muito difícil no futuro e que paralisam qualquer vontade de olhar para a frente. Numa imagem metafórica, os mais novos olham para baixo, não lhes é permitido levantar a cabeça, erguerem-se e procurarem a linha do horizonte ou fixarem-se no céu (Strecht, 2024).
Muitos não têm consciência disso, mas estão carregados de um dramatismo antecipado, vivendo submersos num mundo que só lhes anuncia inseguranças, agressões, perversidade, medos e risco, onde nada nem ninguém é fiável, exceto o próprio. Desde o cenário catastrófico das alterações climáticas à falta de habitação, passando pela precariedade dos empregos e baixos salários, tudo lhes é afirmado enquanto certeza de um futuro muito difícil que terão de enfrentar. Disto todos temos de assumir culpas: o que circula maioritariamente em imagem e informação expressa-o de forma continuada. Esquecendo totalmente de abordar o positivo, o que existe enquanto fruto da arte e do engenho do ser humano, a comparação verdadeira entre o que atualmente já alcançamos e como vivíamos há poucas décadas (Strecht, 2024).
Claramente a noção evolutiva das sociedades é esquecida e dá espaço para que os jovens desconheçam que dantes já foi mais difícil em muitos, muitos aspetos e não realmente o contrário do que lhes é transmitido. Como breves exemplos basta relembrar em Portugal a escolaridade obrigatória de quatro anos até 1974, a impossibilidade das mulheres terem acesso a trajetos académicos de relevo, a inexistência do divórcio, a alta taxa de mortalidade infantil, a baixa esperança média de vida, as devastadoras epidemias de doenças infeciosas, o isolamento, muitas habitações eram insalubres e sem serviços básicos como eletricidade e saneamento, a emigração ditada pela existência ativa de pobreza extrema e de fome. Melhoramos muito, não vale a pena duvidar (Strecht, 2024).
Se nada de oposto for revelado aos mais novos, restam-lhes duas atitudes possíveis perante as fatalidades que hoje lhes são anunciadas: agirem como verdadeiros “super-heróis”, altamente dotados de capacidades ou “poderes” especiais e prontos para triunfar segundo a lei dos mais fortes na selva que é esta vida, ou então desistirem e fugirem à ideia de crescer, optando por perder por falta de comparência, como a tão descrita geração “nim”, que já não estuda mas ainda não trabalha, prolongando um longo estado de dependência (forçada ou aceite) dos próprios pais, gozando até ao limite o prolongamento de um padrão de vida eternamente jovem (Strecht, 2024).
Numa data tão próxima dos festejos dos 50 anos do 25 de abril de 1974, espero que a mensagem passada com este artigo através da visão do autor Pedro Strecht, seja de que sim, as coisas no futuro não se avizinham muito fáceis, mas relembremos que há 50 anos eram bem mais difíceis e muito caminho já foi conquistado e continuará a ser, principalmente devido à capacidade do ser humano de feitos extraordinários e de uma resiliência inigualável.
Strecht, P. (2024). Pais Suficientemente Bons: Para Filhos Que Não Têm De Ser Perfeitos. Lisboa: Contraponto Editores.